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23 setembro 2003

Ranger de Portas

Portas preparando o regresso à popular liderança pega na bandeira da imigração para lançar o repto da quota zero, que nem mais um imigrante, nem mais uma legalização, supostamente por incrementar o desemprego!

Portas bloqueia a argumentação dizendo que a quota zero é o que sempre tivémos e, por tal, os clandestinos é que promovem o desemprego ao aceitarem jornas de miséria sem qualquer apoio social ou humano!

Das duas uma, ou é mesmo um problema de portas, como aquelas dos antigos estúdios que abriam uma para cada lado, ou é uma mera procura de bandeiras popularuchas, para esgrimir votos numas putativas eleições. A este propósito já se insurgiu o Abrupto, mas talvez sem insistir veementemente numa tentativa de solução.

A verdade é que desde Salazer nunca se pensou sobre uma política de imigração pois não era um problema – Portugal, há mais de 250 anos que é um país de emigração - sendo o quadro muito recente, advindo da descolonização, primeiro, da adesão à União Europeia e, com mais pertinência, com a queda do muro de Berlim, depois.

O que é verdade é que somos agora um país que deve ter políticas para a emigração e para a imigração, exactamente para não virem a constituir um problema.

É por demais evidente que as nossas mais constantes receitas de há 2 séculos a esta parte advêm das remessas dos nossos emigrantes, de importância crucial para a nossa economia, tendo merecido uma atenção especial dos poderes públicos.

Pelo contrário, no caso da imigração continuamos a deambular entre o arremesso da xenofobia e as pueris ideias de socialismos de gaveta, encapotados por detrás de um ecumenismo social. Aliás, não só neste caso, os nossos políticos têm uma tendência especial para debater até à exaustão da superficialidade os problemas com que o país vai enfrentando no devir da história.

O que urge não é arremessar “nem mais um imigrante” nem o “venham a nós, coitadinhos”! Urge definir uma política de imigração de acordo com os interesses de Portugal, em cada momento, sem afrontar, evidentemente, o humanismo social a que somos obrigados pela nossa condição de aderentes à Carta dos Direitos Humanos. Assim sendo, não me parece que nos interesse nem estancar as portas nem escancará-las, antes abri-las consoantes os nossos interesses, albergando os que nos possam ajudar ao nosso desenvolvimento e evitando aqueles que nada poderão acrescentar.

Vejamos, será que a nossa construção civil será viável sem a mão-de-obra de imigrantes? Só um tonto responderia de forma afirmativa! Nem os empreiteiros podem comportar os salários de pedreiros ou carpinteiros portugueses nem temos profissionais suficientes nesta área.

Será que os licenciados em medicina e enfermagem dos países de leste, que hoje ilegalmente trabalham na construção civil, em mecânica automóvel e eu sei lá que mais, não poderiam ver os seus cursos reconhecidos oficialmente e, mediante a prestação de provas nacionais e públicas tanto dos seus conhecimentos específicos como da nossa língua, serem incentivados a colmatar a insuficiência que padecemos nestas áreas no serviço nacional de saúde?

Por aqui continuaríamos, detectando as nossas insuficiências para promover, através das nossas embaixadas uma imigração que servisse os interessados e o país.

Uma política coordenada de imigração é urgente para colmatar sectores de actividade que somos deficitários de mão-de-obra, por falta de quadros especializados ou por manifesto desinteresse dos portugueses em desempenhar algumas tarefas, contribuíndo para um aumento substancial de contribuintes para a nossa segurança social bem como para o IRS.

Não precisamos de ranger de portas, nem de portas contrárias, precisamos de uma só porta, bem lubrificada, que abra quando deve abrir e para quem deve abrir.