Este Ideias Soltas abriu-se sem disso se aperceber e, template arrumado, ficou sem saber para que serviria! Serviu-se da sua preocupação pela AMEC para a AMEC servir e de Ideias Soltas só da AMEC brotou!
E agora, porra, que vou fazer disto?
Confesso que não sei, tentarei ir como fui, ao sabor, na corrente das minhas preocupações, de louco seguramente, pois não as vejo nos reputados órgãos de comunicação social!
Serei marginal ou de mim quererão fazê-lo? Não sei, mas qualquer das hipóteses me agrada, seduz-me a preocupação daqueles que ainda fazem por amor, ou fazem porque fazem, acreditando no que vão fazendo, por alegria que é a maior manifestação de liberdade que conheço. Cito um grande amigo, José Augusto Mourão, “A alegria torna-nos sempre livres, enquanto a liberdade nos pode tornar tristes ou não.”
Então, um destes dias recebi um email de B. O., devidamente identificado, que manifesta uma profunda preocupação, não de agora antes de longa data, a da ausência de divulgação da música dos nossos compositores. Aqui vai, seguindo-se um breve comentário:
Caro Carlos Alves,
Porque se trata de um assunto relacionado com a música aqui estou para chamar a atenção de uma notícia que li hoje no JL.
A Orquestra Nacional do Porto vai lançar dois discos por si interpretados: de Tchaikovski a Sinfonia nº 4 e Romeu e Julieta; de Brahms o Concerto de Piano nº 1 e as Variações Haydn, sendo solista no Concerto o pianista António Rosado.
Obras arqui-tocadas!
Como é possível gastar-se dinheiro nisto? Serão discos para oferecer no Natal?
O mercado está inundado destas obras. Só da Sinfonia nº 4 há pelo menos dezenas de versões, de difícil escolha, qual delas a melhor: Sanderling, Karajan, Mravinski, Svetlanov, Barbirolli, Toscanini, Bernrstein, Monteux, Markevitch, etc., etc., e pelas melhores orquestras do mundo.
Do Concerto do Brahms há mais de 20 versões e pelos melhores pianistas do mundo! Agrada-me que Rosado seja mais um mas preferia que gravasse música portuguesa.
O mesmo para a Orquestra Nacional do Porto.
Que eu conheça, há meia-dúzia de discos com música portuguesa por orquestras portuguesas. Há mais discos com música de orquestra mas são orquestras húngaras.
Como é possível que não sejam divulgadas as obras de autores portugueses?
Onde está a música sinfónica ou concertante de Freitas Branco,Cláudio Carneiro, Lopes Graça, Armando José Fernandes, isto para referir os mais antigos?
Felizmente que a Naxos está a editar Joly, a Hyperion editou Viana da Mota, a Numérica compositores jovens e a La mà de Guido, de Carrapatoso.
Quem são os responsáveis que mandam gravar Tchaikovski e Brahms em 2003 pela Orquestra Nacional Porto?
É preciso denunciá- los na praça pública.
Fiquei indignado com a notícia. Desculpe o desabafo mas ocorreu-me que seria interessante abordar a questão da música portuguesa no seu blog.
A preocupação de B. O. é justíssima. Com efeito, os compositores portugueses têm mais obra orquestral gravada no estrangeiro que entre nós o que é no mínimo caricato! Ainda ontem Jorge Sampaio dizia em terras castelhanas que era estranho nenhuma empresa portuguesa ter almejado até ao momento ganhar um concurso em Espanha. Dizia e dizia bem, é que neste apregoado e sacralizado mundo neo-liberal exporta-se o liberalismo enquanto no recato caseiro se protegem contra a sua invasão através dos mecanismos à disposição do Estado. E nesta matéria todos se entendem, da direita à esquerda, menos entre nós, os arautos do “non sense”, que não cuidamos atempadamentte de defender os nossos interesses e parecemos preocupados em defender, por inusitado princípio ético e moral, a “finantia” internacional.
Mas voltemos ao pomo.
Por preposições (sempre me pareceu um dos métodos mais adequados):
1 – Terá a Orquestra Nacional do Porto obrigação de gravar música de compositores portugueses?
2 – Terá António Rosado obrigação de gravar música portuguesa?
Certamente que não. A liberdade de um músico escolher o que interpreta é inalienável. Em tempos, no interrompido Fórum da Antena 2, discutiu-se se Maria João Pires teria ou não obrigação de gravar compositores portugueses. Como é evidente as opiniões dividiram-se, cada um guardando a sua, mas para mim é líquido que se a um intérprete for negada a liberdade de escolha está definitivamente hipotecada a qualidade da sua manifestação artística por força de não se expressar onde entende que terá algo para dizer.
Quero com isto dizer que não estou de acordo com B. O.?
De forma alguma! Vejamos a preposição seguinte:
3 – Quando uma intervenção artística é financiada ou apoiada por dinheiros públicos será lícito que se exija que se interpretem autores portugueses?
Não, não tem sido, mas acho que sim! De facto não deve ser imposto ao artista um programa, mas deve ser obrigação das entidades públicas que financiam ou apoiam exigir que tal aconteça, no caso concreto desde duplo CD, incluir, vá lá, ao menos, uma obra portuguesa de folgo.
Não sei se houve ou não qualquer financiamento para a produção deste CD da Orquestra Nacional do Porto, mas a própria instituição é substancialmente financiada pelo Estado, sendo que, se a António Rosado não deveremos exigir que só interprete obras de compositores portugueses (aliás já o fez em gravações anteriores), já me parece de muito mau gosto que a ONP a tal não se obrigue, nem pelos financiadores estatais seja obrigada.
Quem não estiver de acordo bata-me primeiro para eu perceber o porquê.