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09 janeiro 2004

Dei com isto e ganhei o dia

Francisco José Viegas reconhece que «todos somos um pouco culpados: o optimismo histórico também é um dos males que, periodicamente, assalta a vida das sociedades, criando ilusões e inventando esperanças. Em meados dos anos oitenta, quase todos nós acreditámos numa coisa que hoje nos parece ridícula, vista à distância o boom editorial. A quantidade de livros editados desde essa altura e não comprados nem lidos é assustadora o bastante. Os mais pessimistas achavam a situação absurda, mas os optimistas começaram cedo a franzir o sobrolho. As editoras cresceram por dentro mas, por fora, o mercado não cessou de diminuir. Esse desacordo é fatal, hoje em dia. Basta ver que, na lista dos livros lidos no último ano apenas um editado nesse período de tempo a verdade é que as tiragens diminuíram nos últimos dois anos, não diminuindo a quantidade de títulos publicados. Não é preciso ser economista para prever os resultados nada satisfatórios desta situação.» (6) E conclui: «O livro não é popular em Portugal. Se calhar, não tem de ser popular, tal como os escritores. O juízo popular não serve para avaliar a qualidade dos livros, evidentemente, nem a sua importância. Mas alguém tem de pensar no assunto, e, aí, o Estado, as escolas e as famílias terão, necessariamente, de ser responsabilizados.» (7)

Este excerto retirado de um ensaio de 1994 de José Leon Machado, publicado na Letras e Letras, sob o título «Motivação para a Leitura», que aconselho vivamente a leitura integral, aqui, abordava um problema grave e agudizado até hoje. O que Francisco José Viegas escreveu é hoje, assustadoramente, mais verdadeiro que há 9 anos e, apesar de se debruçar sobre o livro e a leitura, é válido e pertinente para as artes em geral e para a cultura e educação em particular.

O problema permanece, agudiza-se cada dia que passa, transversalmente atravessa os sucessivos partidos e governos, poderes e instituições, arautos deste turpor de niilismo vivificado de conceptual pragmatismo mascarado e questiono-me, amargamente, o que nos poderá continuar a distanciar para juntos impedirmos, nós, sim, nós, a tal sociedade civil que proclamam porque com razão acreditam na sua incipiência, que destruam a nossa memória, identidade e, em última instância, a nossa capacidade de sermos conscientemente livres.

Percebo o desânimo de FJV quando fala deste bloco central que há décadas abulicamente nos deixa em letargia, mas não, não vai com denúncias, vai com acções, firmes e escorreitas, contra a mediocridade deste facilitismo que impingem aos nossos filhos para que continuem a ser não os «Cordeiros de Deus», antes tão-só cordeiros, os deles.

Deixemo-nos de novelas, Bigs ou Pias! Jogue-se essa merda para o lixo e associemo-nos na essência, no totem.