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17 março 2004

Sobre resposta ao post anterior

Gentilmente, o Sr. Prof. Dr. A. Toucinho da Silva comentou o que eu disse no anterior post sobre o debate de ontem no Instituto Politécnico de Beja, moderado pelo próprio senhor Professor, que aconselho a leitura para se compreender esta resposta, em forma de carta aberta que enviei antecipadamente por correio electrónico ao destinatário.

Ex.º Senhor
Prof. Doutor A. Toucinho da Silva

Aceito, naturalmente, as dificuldades de moderar um "debate" onde ninguém pretende ouvir nem nem questionar sobre o que já, para si, deliberou. Foi difícil para o Sr. Prof. Dr. Toucinho da Silva e sê-lo-ia para qualquer um. Conforme aqui antevi tudo indicava que seria mais um debate de surdos, ensurdecidos pelos partidos em que cada um milita. No entanto, mesmo aceitando que não terá o Sr. Prof. actuado deliberadamente, não posso corroborar a sua versão de que foram atendidos por ordem de inscrição os pedidos de intervenção. Aliás, quando eu próprio alertei para o facto, o Sr. Prof. Dr. Toucinho da Silva informou o auditório que pelo facto de se encontrarem vários senhores autarcas na plateia seria um benefício ouvir a sua opinião, tendo sido exactamente nesse momento que senti que tinha ido ao engano, abandonando a sala. De um debate entre os cidadãos anunciado fomos todos confrontados com uma reunião do tipo da Associação do Munípios do Distrito de Beja.

Escreve mais adiante o Sr. Professor e passo a citar:
"Infelizmente estavam presentes elementos do PS e do PCP que, em vez de contribuirem para um debate esclarecedor, se empenharam em provocar os adversários políticos.
Enquanto o PS e o PCP colocarem a luta partidária à frente do debate e do esclarecimento das populações, dificilmente chegaremos a ideias claras sobre este assunto. E é por isso que apelo aos responsáveis políticos para que se abstenham de incendiar debates desnecessariamente. A luta partidária tem os seus espaços próprios e não deve ser levada para onde devemos estar todos juntos na defesa do nosso Alentejo
."

Porque só acusa o PCP e o PS de colocarem a luta partidária à frente do debate? Porque não inclui o PSD que, através das palavras de Sr. José Raúl dos Santos ficamos também a saber que, de repente, num abrir e fachar de olhos, mudou de opinião tal qual o Sr. Carreira Marques? A razão de acusarmos o Presidente da Câmara de Beja, tal como o faz o Praça da República, aplica-se também ao Sr. Presidente de Câmara de Ourique e a questão está à vista: o PCP quer só uma região para o Alentejo porque assim dominará a maioria das Assembleias Municipais enquanto o PS e o PSD preferem uma região do Baixo Alentejo e Alentejo Litoral pela mesmíssima razão!

O que para mim está em causa, estimado Sr. Prof. Doutor Toucinho da Silva, é que já fui e venho dizendo há meses - a total indiferença e desprezo dos autarcas pelos eleitores, sejam eles de que partido forem! Até ao momento nenhum autarca alentejano promoveu debates e discussões públicas sobre esta tão premente matéria que está em cima da mesa para discussão há quase um ano, mais precisamente há 10 meses (que eu tenha tido conhecimento)! Ora, atendendo a que nenhuma das forças partidárias conseguiu, nas eleições autárquicas de 2001, mais de 35% dos votos dos eleitores inscritos, atendendo a que a abstenção no Baixo Alentejo foi de 36,75%, no Alto Alentejo de 36,43% e que a média dos quatro concelhos do litoral alentejano incluídos no Distrito de Setúbal foi de 39,95%, constacta-se que nenhum dos partidos que venceram as eleições conseguiu vencer a abstenção, ou seja, aqueles aquem os partidos não conseguiram motivar a exercer o seu direito de cidadania. Este facto tem sido escamoteado por todos os partidos políticos, parecem ter nojo de abordar este assunto, sendo eles os principais culpados do afastamento dos cidadãos de uma participação activa na construção do país.
Neste contexto, e no que ao reordenamento administrativo do Alentejo diz respeito, não me parece que os autarcas tenham legitimidade e muito menos mandato para tomar qualquer decisão! Mas os senhores não conseguem alcançar isto! Ainda ontem assistimos, logo através das intervenções dos autarcas com assento na mesa, ao manifestaram as suas posições parecendo vincular as das Câmaras que lideram, sem qualquer rebuço ou timidez, como se um, digo bem, um único eleitor os tivesse mandatado para o efeito!

Mais grave ainda é o facto de que quando algum cidadão não acantonado num qualquer partido político, exprime a sua opinião ele é logo catalogado de ser anti este ou aquele partido, conforme o "dictat" de cada estrutura partidária ou, na pior das hipóteses, pessoa não dotada de estatuto adequado e autorizado!
Enquanto não se perceber que os partidos políticos representam cidadãos para executarem as propostas constantes nos seus programas, mas nunca se substituem ou sobrepõem aos seus eleitores a democracia perde e, perdendo esta, perde o país e, no que a nós diz respeito, perde o Alentejo, nomeadamente, o Baixo Alentejo.
O que me incomoda não é a luta partidária que parece incomodar o Sr. Prof. Doutor Toucinho da Silva, antes a total falta de respeito pela opinião dos cidadãos que os elegem, aos quais disponibilizam a superior paciência de aturar nas campanhas eleitorais. A partir desse momento mais nada pretendem saber do seu sentir ou opinião.

Por último e a propósito, endereço ao Sr. Prof. Toucinho da Silva o meu aplauso pela inciativa de promover um debate público sobre o futuro ordenamento do Baixo Alentejo, mas permita achar pouco o que o Instituto Politécnico de Beja fez por tão estrutural assunto que condicionará o nosso futuro. Com efeito, apesar desta isolada iniciativa, o IPB promoveu e ainda decorre um "Ciclo de Debates sobre o Alargamento da U.E" enquanto outras universidades, por exemplo, a do Porto, promove um vasto ciclo de debates e mesas-redondas com especialistas filiados ou não em partidos políticos. Talvez ainda o IPB vá a tempo...

Atentamente

Com os cordiais cumprimentos

Beringel, 17 de Março de 2004

Carlos Araújo Alves