Leio no Adufe, no Irreflexões, no Terras do Nunca, na Planície Heróica, no Bloguítica, talvez até em Aviz, comentários sobre arrefecimentos, esmorecimentos, quebras de visitas e até quão difícil poderá ser a sobrevivência de alguns Blogs.
Crise na Blogosfera!?
Não percebo! Começo por não perceber como é que alguém poderá exprimir-se em nome de uma blogosfera. Que blogosfera? A sua, certamente!
O que, de facto, diferencia este meio de comunicação dos demais é precisamente a ausência de um código formal de conduta, de um estipulado anterior, de uma chefia de redacção, de uma entidade que regule a liberdade (que contrasenso essencial). Ora, como medir essa hipotética crise, como entendê-la (quebra de visitas?), de que forma a percepcionar?
Isto é uma coisa muito pessoal, mas tenho para mim que "a quebra de vendas" só deve afectar os blogs que sejam um prolongamento não institucional, mas em muitos dos casos institucionalizado, dos orgãos de comunicação social ou de estruturas partidárias. Na verdade são nos que eu mais leio sobre essa hipotética crise blogosférica. Bem pelo contrário, naqueles que são o que são, o que os seus autores deles fazem, das duas uma, ou se ajustam numa ética mais ou menos positivamente identificante ou sofrerão, também eles, descidas de visitas.
O curioso é que ainda noutro dia, em conversa com o Francisco Nunes sobre este coisa do pós-modernismo, dizia eu que este novo e único meio totalmente livre de comunicação é o paradigma de que já vivemos nessa era, que temos receio de nomear, pós-modernista, que Gilles Lipovetsky enunciou já em 1983, em "LÈre du Vide". Veja-se:
no 'Pós-modernismo', "o indivíduo mergulha profundamente em crescente indiferença perante tudo aquilo que o rodeia, especialmente por excesso de estímulos (sexdução geral), que tendem a nulificar a sua personalidade; e como reacção, este indivíduo começa a aderir a processos de personalização e narcisismo, tentando sobreviver com sanidade a um mundo demasiadamente cheio de informação e em que ninguém sabe verdadeiramente de nada (...)".
O Francisco Nunes arrepiava-se só de pensar na anunciada negação de valores, ausência de ética ou de moral, e com razão! Mas, o que os teorizadores sempre esquecem, quando pretendem ilustrar o futuro, é que todo o homem, por mais livre que seja e se sinta, é sempre um produto de uma identidade geo-social que o aculturou e vai aculturando. O niilismo de que nos fala José Augusto Mourão, é um perigo meramente epistemológico. De facto, esta nova era da personalização (nas palavras de Lipovetsky), onde as pessoas só falam de si mesmas, querem ser ouvidas, mas não querem ouvi,.querem comunicação sem compromisso (talvez a surdez e o mutismo referido por Aviz), esbarra na realidade do código necessário à prossecução dessa mesma liberdade.
Daí as justas palavras de Raúl Kerbs ao afirmar:
"O pós-modernismo não propõe um caos moral, mas redireciona as preocupações éticas mediante um compromisso fraco, efêmero e indolor, com valores que não interferem na liberdade individual: Não é tanto hedonista como neo-hedonista. Essa mistura de dever e negação do dever na ética pós-modernista torna-se necessária porque o individualismo absoluto destruiria as condições necessárias para facilitar a busca de prazer e realização individual".
Ou seja, crendo que não haja capacidade de teletransporte para a Idade da Pedra Lascada, todos nós, dentro de nós, consubstancial a nós, temos um código ético que nos conduz e que nos sociabiliza! Daí que, se Michel Foucault, Gilles Deleuze e LipovetsKy se foram apercebendo desta mutação libertária do eu, do tal narcisismo vigente, tal qual em laboratório, isolaram o homem do seu habitat, da sua cultura, falseando assim a visão apocalíptica do caos da anti-ética.
Tratar-se-á, com efeito, de uma selecção cultural que inevitavelmente faremos entre nós, ora aproximando, ora afastando-nos dos nossos interlocutores da rua ou da blogosfera.
Se há coisa que permanece neste devir do Homem é a sua inabalável capacidade de se interrelacionar, ora seduzindo ora guerreando, fazendo amigos e inimigos, e de inimigos, amigos e vice-versa, nesta louca incoerência relacional que permanecerá muito para além de nós.
Por isso não percebo isso de crise blogosférica, uns perderão visitas, outros aliar-se-ão e outros desaparecerão enquanto que outros sempre surgirão até que surja outro paradigma!
Ai de nós, no entanto Francisco Nunes, se neste "Mundo das Redes" de J. A. Mourão, não cuidarmos de preservar a nossa memória colectiva para, através dela, passarmos os valores adequados aos vindouros para que estes não se sintam perdidos ou mesmo esmagados pelos falsos profetas do niilismo globalizador!
Ah, e como sempre foi, e será, haverá sempre o bem e o mal explelido por cada um de nós, sendo que o que varia é a forma como o misturamos e exalamos - o mito do céu e do inferno!